segunda-feira, 23 de julho de 2012

Produção de cacau fino desponta na Bahia

A fase áurea dos barões do cacau no Brasil ficou na história e nas minisséries de televisão, mas um grupo ainda pequeno dos produtores que continuam na atividade agora busca uma nova forma de ascensão. Em um cenário marcado pelos baixos investimentos e custos que normalmente empatam com os preços finais, cresce a aposta na produção de cacau fino e gourmet.
Com cuidados especiais nas fases de pós-colheita, fermentação e secagem, é possível produzir um cacau com características superiores de sabor e acidez, que proporcionam melhor qualidade. O produto pode ser usado na fabricação de chocolates com alto teor de cacau ou simplesmente misturado a leite e açúcar.

Representantes do setor acreditam que o cacau fino representa apenas 5% do mercado mundial, enquanto os 95% restantes são preenchidos pelo chamado "bulk", que é um padrão médio. Não há estatísticas precisas sobre o montante financeiro desse segmento, mas os preços pagos ao produtor podem superar 100% do valor negociado em bolsa, enquanto o custo de produção é de 35% a 50% superior.
Para os produtores brasileiros que decidiram enveredar por esse caminho, é uma forma de continuar na atividade, cujo auge foi nos anos 1970 e 1980 e que depois sofreu com o aparecimento da vassoura-de-bruxa, um fungo que provoca o apodrecimento dos frutos e grandes perdas à produção (ver matéria ao lado).
A qualidade da grande massa dos cacaueiros brasileiros ainda é considerada mediana frente aos maiores países produtores. Mas, na avaliação do pesquisador da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Almir Martins dos Santos, é melhor que a de Costa do Marfim (maior produtor mundial) e Indonésia (terceira maior). Já o cacau fino do Brasil é reconhecido pelo mercado global, embora não esteja na lista da Organização Internacional do Cacau (ICCO) dos países que se destacam por esse tipo de produto.
Santos coordena um grupo que levanta dados da produção nacional do cacau fino para que a ICCO inclua o Brasil nesse time. Para que isso aconteça, é preciso comprovar que entre 3% e 5% da safra nacional é desse tipo de amêndoa. O pleito deve ser apresentado ainda este ano. Ele acredita que o cacau fino represente cerca de 3% da produção total. Além da Bahia, Espírito Santo e Pará também abrigam lavouras com cacau fino.
Como sexto maior produtor mundial e terceiro maior consumidor de chocolate, o Brasil começou a trilhar o caminho da qualidade superior no cacau há poucos anos. Para Durval Libânio Netto Mello, presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Agronegócio do Cacau, uma prova de que a qualidade brasileira é reconhecida no mundo é o fato de alguns produtores já terem sido destacados em concursos de qualidade promovidos no exterior.
Em suas contas, cerca de 2% a 3% da produção baiana é de cacau fino. A meta é chegar em 10% em cinco anos, caso sejam implementados projetos para melhor organizar o segmento e saia a indicação geográfica do produto do sul da Bahia. No Brasil, existe indicação geográfica apenas para o cacau produzido em Linhares (ES), outorgada este ano.
Libânio calcula que devem ser produzidas em torno de 3,5 mil toneladas de cacau fino no país este ano. A maior vitrine recente da qualidade do cacau brasileiro foi o "Salon du Chocolat", que ocorreu no início do mês em Salvador. O evento foi realizado pela primeira vez em um país da América Latina.
De quatro anos para cá, diz Libânio, também aumentou o número de produtores na Bahia que instalaram fábricas de processamento de cacau de pequena escala, com capacidade média de cerca de 150 toneladas. São cerca de dez unidades no Estado com esse perfil, de acordo com ele. A produção é vendida no mercado local e algumas exportam.
Eimar Sampaio Rosa, diretor da empresa M. Libânio Agrícola, começou a exportação de cacau fino em 2009. A empresa familiar, com mais de 90 anos no mercado, tem 14 fazendas e investe para inaugurar em 2013 uma fábrica para a produção de massa de cacau de alta qualidade, em parceria com uma cooperativa. Por três anos seguidos a empresa teve suas amostras classificada entre as 50 melhores em concursos promovidos durante o "Salon du Chocolat". Hoje, 34% da produção total é de cacau fino. "Ainda é um mercado pequeno, elitizado, para quem tem paladar mais exigente", afirma ele.
Além da qualidade, o Brasil pode ganhar pontos lá fora com o modelo de produção. Especialistas dizem que o produtor de cacau da Bahia foi capaz de praticar o desenvolvimento sustentável ao longo de quase 150 anos. A amêndoa chegou à Bahia em 1867, trazida do Pará, e expandiu-se em Ilhéus, no sul do Estado. Segundo Antonio Zugaib, chefe de planejamento da superintendência da Ceplac na Bahia, 70% da produção baiana é feita com o sistema chamado "cabruca", no qual o plantio é debaixo das árvores da Mata Atlântica.
A prática é considerada conservacionista, embora de menor produtividade que o cacau cultivado a pleno sol. O nome do sistema vem do verbo "cabrocar", que significa roçar, tirar árvores menores. Zugaib acredita que a Bahia tem condições de suprir o déficit nacional, estimado em mais de 40 mil toneladas. Apesar da descapitalização dos produtores, ele afirma que o cacauicultor está entusiasmado com a agregação do valor da produção de cacau de melhor qualidade e sabor diferenciado, além do trabalho de assistência técnica.

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