quinta-feira, 26 de abril de 2012

Morreremos mais um pouco

Foi preciso uma celebridade de Hollywood fazer a denúncia para que o Brasil prestasse atenção na ameaça de genocídio que pode acabar com o povo Awá, uma das últimas tribos de caçadores-coletores do planeta. Os índios de pele morena, cabelos lisos e negros e olhinhos puxados vivem como a espécie vivia há 20 mil anos. Eles somos nós, antes que começássemos a inventar modos de dominar a natureza. Deu no que deu.
Caçar e colher foi o primeiro modo de subsistência do homo sapiens. Era assim que vivíamos antes da revolução agrícola. Quando, há 10 mil anos, a espécie inventou a AGRICULTURA, os povos que ainda viviam da caça e da coleta foram considerados parasitas e escorraçados para terras improdutivas. Vê-se que o homo sapiens não mudou tanto assim - apesar do vistoso verniz de civilização e tecnologia. 

O vídeo exibido no site da superpoderosa ONG Survival Internacional mostra o modo ancestral de vida dos Awá. Uma menina brinca com um periquito, um pequeno primata se acomoda nos cabelos de outra menina. Uma mulher amamenta um macacaquinho. Um pequeno grupo sai em trilha pela floresta.
Observem o rosto dessas criaturas que habitam a pré-história. Não há tensão entre os olhos, a boca descansa placidamente sob o nariz. Há uma expressão de natural plenitude, como se o medo e a angústia, a euforia e a agitação nunca tivessem maculado a alma daquela gente. Eles existem - apenas. Experimentam o viver, como se passado, presente e futuro fossem uma mesma instância.
Mas os índios têm todos os motivos do mundo para o sofrimento. Estão sendo dizimados por madeireiros e garimpeiros, com a omissão dos governos. Suas terras vêm sendo devastadas por todos os lados. Calcula-se que existam 360 Awá contatados e outras sete ou oito dezenas escondidos na Floresta Amazônica, no estado do Maranhão.
A superpoderosa ONG Survival Internacional convidou o ator Colin Firth (que levou o Oscar de melhor ator por O discurso do rei) para a campanha que pretende mobilizar o mundo na tentativa de salvar "a tribo mais ameaçada do mundo". Quem sabe com a denúncia vinda de Hollywood, os brasileiros se sensibilizem com o destino que está sendo traçado para os Awá.
Awá significa "homem", "pessoa" ou "gente". No período da estiagem, eles realizam a ohó iwa-beh, viagem para o céu, cerimônia religiosa na qual os homens incorporam antepassados e entidades espirituais e, nessa condição, conversam com as mulheres, benzem os familiares e trazem recados do céu. O olhar estrangeiro acompanha os Awá desde meados do século passado, quando o etnólogo Curt Nimuendaju publicou estudo sobre os caçadores-coletores que habitam a Amazônia maranhense.
É surpreendente que, depois de 500 anos de persistente e cruel dizimação das nações índigenas, ainda existam povos isolados. Eles sabem que aqui do outro lado, onde vive o dito homem civilizado, não há céu ao seu alcance. Só o desprezo e a morte.

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