sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Balanço melancólico, que poderia ser outro

WASHINGTON NOVAES- JORNALISTA - Chega-se ao fim do ano com uma sensação de desconforto, ansiedade, ante as incertezas do panorama econômico no plano mundial, que podem afetar as perspectivas de todos os países - inclusive do Brasil. Ao mesmo tempo, um olhar de relance sobre a evolução global nas duas últimas décadas leva a rever afirmação do mestre da economia polonesa Michal Kalecki, que seu discípulo, o professor Ignacy Sachs - a quem tanto deve o pensamento econômico/social/ambiental -, costuma citar:uma ideia nova leva o tempo de uma geração (20 anos) para chegar à prática. Porque a recapitulação das duas últimas décadas mostra um balanço melancólico.
Na conferência Rio-92,a gravidade da situação no clima e a necessidade de atuação imediata para reduzir emissões de poluentes levaram à criação de uma Convenção do Clima; duas décadas depois, na recente reunião de Durban,aprovou-se uma declaração que fixa para 2015 a aceitação, por todos países,de compromissos obrigatórios para reduzir as emissões - mas para chegarem à prática só em 2020, daqui a quase 10 anos, 40 anos após a Rio-92. A perda brutal da biodiversidade no mundo levou, também em 1992, a uma Convenção da Diversidade Biológica; mas um balanço na reunião de Na goya, em 2010, mostrou que continuamos a perdê-la e já sacrificamos mais de 30% das espécies.
Aprovou-se,em 1992,uma declaração sobre florestas, porque se perdiam no mundo 17 milhões de hectares a cada ano;continuamos a perder muitos milhões de hectares anuais, mais de 6 mil km2/ano no Brasil.Também se escreveu na Agenda 21 mundial que os países ricos aumentariam sua contribuição para reduzir a pobreza, de 0,36% do PIB anual para 0,70%; 20 anos depois, essa contribuição média já baixara.
Nesse panorama, surpreendem certas avaliações sobre o Brasil,como a de que é o país que mais contribui para reduzir emissões de poluentes - quando nos esforçamos em Durban para passar de 2015 para 2020 o início dos compromissos a serem firmadosem2015; porque se o ano fosse este último,teríamos de rever o "compromisso de redução voluntária",que é o de baixarem 40% as emissões,mas só calculadas pelo que seriam em 2020, um futuro hipotético. As avaliações sobre a redução do desmatamento entre nós a comparam com a média dos anos mais intensos de corte.De qualquer forma, continuamos a emitir maisde10 toneladas anuais de carbono por pessoa.
Um capitulo à parte continua a ser escrito pelo projeto de novo CÓDIGO FLORESTAL, que certamente ampliará o desmatamento, com a redução das áreas obrigatórias de proteção à beira-rio, em encostas e topos de morros, além de mangues - sem falar na anistia para a maior parte dos desmatadores ilegais. E na falta de recursos do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama para atuar com eficiência nesse setor.
As áreas cobertas pela conferência de 1992 não são as únicas a produzir sensação de desconforto, internamente. Tome-se, por exemplo,o setor dos recursos hídricos, com a Agência Nacional de Águas a indicar que todas as nossa bacias hidrográficas,da Bahia ao Sul, estão em "situação crítica"; que mais de metade dos municípios brasileiros terão problemas graves no abastecimento urbano em poucos anos; que a perda de água nas redes públicas de distribuição continua acima de 40%. Nas últimas semanas,para completar, informa este jornal que estão paralisadas, em 6 dos 14 lotes, as obras da transposição de águas do Rio São Francisco, embora o orçamento total já tenha aumentado em R$ 1,8 bilhão, para chegar a R$ 6,8 bilhões, dos quais R $3,8 bilhões já foram empenhados e R$ 2,7bilhões,pagos.
E,muito grave também,pelo menos metade da população brasileira continua a não dispor de rede de coleta de esgotos - e por isso mesmo o despejo de esgotos sem tratamento em cursos d"água é a maior causa de poluição no País.
Muito relacionada com a área dos recursos hídricos é a da energia, em que se agravam os conflitos pela ampliação de projetos de usinas na área amazônica(Bacias do Xingu, do Tapajós,do Teles Pires).
Sem que-como já tem sido dito tantas vezes nesse espaço- o Ministério de Minas e Energia se disponha a discutir com a comunidade científica e a sociedade nossa matriz energética e as alternativas que têm sido indicadas pela ciência, a começar pela possibilidade de forte redução do consumo, com programas de eficiência e conservação.Na verdade, a prioridade absoluta tem sido para obras que influenciem o crescimento do produto interno bruto (PIB).
Agora,quando organismos internacionais já acenam com a possibilidade de redução forte na taxa de crescimento do PIB brasileiro em 2012, cabe perguntar: qual é nossa estratégia mais ampla? Seguir como obreirismo a qualquer custo? Não seria o caso de tentarmos fazer valer a excepcional possibilidade de sermos dotados de recursos naturais abundantes, no momento em que eles são o fator escasso no mundo? É uma vantagem comparativa única.Não deveríamos caminhara passos largos para uma matriz energética "limpa" e renovável, outra possibilidade quase única no mundo? Seguiremos no modelo imposto pelos países centrais, de sobre valorizar produtos industrializados e suas tecnologias-que eles produzem- e depreciar recursos naturais e produtos "primários" que importam? Analistas de vários matizes afirmam que a crise do Primeiro Mundo não tem caminho definido para se encerrar - e seja qual for ele, levará anos e produzirá fortes consequências, até que se defina quem pagará os custos (a sociedade? O sistema financeiro?).
E também se defina como se fará para reaproximar o mercado do dinheiro( que gira centenas de trilhões de dólares por ano) da realidade concreta (o PIB mundial está na casa de 62 trilhões de dólares, apenas).
Nessa hora,é preciso considerar: um país como o Brasil tem tudo para influenciar na mudança de rumos, e não apenas dos
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Um país como o Brasil tem tudo para influir na mudança de rumos, e não apenas dos internos

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